Hoje, abordaremos algumas inovações do NCPC no que tange às disposições gerais dos recursos especial e extraordinário (arts. 1.029 a 1.035).
Em primeiro lugar, cabe destacar que os recursos especial e extraordinário são recursos de estrito direito, cabendo à parte, quando da sua interposição, demonstrar o cabimento do recurso interposto e as razões do pedido de reforma ou invalidação da decisão recorrida (NCPC, art. 1.029, I a III).
No destaque de Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello, “o artigo ora comentado diz respeito à forma de interposição dos recursos especial e extraordinário. As hipóteses de cabimento desses recursos estão nos arts. 105, III, a, b e c; e 102, III, a, b, c e d, ambos da Constituição Federal. Temos sustentado que o único fundamento genuíno do recurso especial é a ofensa ao direito federal – 103, III, a, sendo as letras b e c hipóteses, não exaurientes, em que esta afronta pode ocorrer. Do mesmo modo, o único real fundamento do recurso extraordinário é a ofensa à Constituição Federal, art. 102, III, a, que seja revestida de repercussão geral, ou seja, que extrapolando a esfera de interesse das partes, seja relevante para todo o país. As letras b, ce d nada mais são do que hipóteses em que esta ofensa pode ter lugar. As demais letras além da a dos arts. 105, III e 102, III, não aumentam o espectro de cabimento dos recursos especial ou extraordinário.” (Primeiros comentários ao novo código de processo civil, São Paulo: RT, 2015, p. 1491-1492).
Obviamente que os fatos também constarão desses recursos, mas não serão objeto de novo julgamento pelo STJ e STF. Conforme lecionam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, “o material que pode ser trabalhado em recurso extraordinário e recurso especial, portanto, é composto de fatos e de direito – até mesmo porque fato e direito se interpenetram no processo de delimitação do caso, interpretação e aplicação do direito. O que não é possível é rediscutir a existência ou inexistência dos fatos em recurso extraordinário e em especial (súmula 279, STF, e súmula 7, STJ). Vale dizer: o recorrente tem que trabalhar com o caso em seu recurso partindo da narrativa fática estabelecida pela decisão recorrida.”. (Novo código de processo civil comentado, São Paulo: RT, 2015, p. 968).
Importante novidade está no §2º do art. 1.029, que assim determina: “Quando o recurso estiver fundado em dissídio jurisprudencial, é vedado ao tribunal inadmiti-lo com base em fundamento genérico de que as circunstâncias fáticas são diferentes, sem demonstrar a existência da distinção.”.
Busca-se, dessa forma, na esteira da exigência de fundamentação contida no art. 489, §1º, do NCPC, evitar as chamadas “decisões-padrão”, que servem de (pseudo) embasamento para qualquer tipo de pronunciamento judicial. Cássio Scarpinella Bueno também entende assim: “trata-se de expressa aplicação da diretriz contida no art. 489, §1º, V, e que, indo de encontro com a caudalosa prática em sentido contrário do Superior Tribunal de Justiça, vai ao encontro do que o novo CPC pretende na construção da ‘teoria dos precedentes à brasileira’.” (Código de processo civil anotado, São Paulo: Saraiva, 2015, p. 667).
De igual modo, mais uma vez tentando evitar o êxito da conhecida “jurisprudência defensiva” dos tribunais, o §3º do mesmo dispositivo do Novo Código deixa claro que o STF ou o STJ “poderá desconsiderar vício formal do recurso tempestivo ou determinar a sua correção, desde que não o repute grave”. A regra é a da sanabilidade das nulidades processuais, almejando a resolução do mérito a todo custo. Nesse sentido, conforme posição tomada pelo Fórum Permanente de Processualistas Civis, fica, portanto, superado o entendimento sedimentado no enunciado nº 115 da Súmula do STJ (“Na instância especial, é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos”).
O §4º desse mesmo dispositivo, por sua vez, trata da possibilidade de o presidente do STJ ou do STF, quando estiver diante do processamento do incidente de resolução de demandas repetitivas, receber requerimento de suspensão dos processos nos quais se discuta a questão constitucional ou infraconstitucional e, ainda, considerando razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, estender a suspensão a todo território nacional.
Apesar de constituir tema que merece muito maior aprofundamento, cabe dizer que os tribunais superiores devem pautar a sua atuação na busca pela uniformidade, estabilidade, integridade e coerência das suas decisões (NCPC, art. 926). E é exatamente essa uma das principais funções dos recursos extraordinários lato sensu: conferir unidade ao direito através da escolha de interpretação mais adequada. Conforme lição de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, “é preciso perceber que, partindo-se do pressuposto que a norma jurídica constitui resultado e não objeto da interpretação, facilmente se conclui que a tarefa de uma corte de vértice não pode ser a de tutela da norma do legislador contra eventual arbítrio do judiciário (simplesmente porque o direito antes da interpretação é duplamente indeterminado), a fim de que se logre unidade do direito – e, portanto, vigência efetiva, e não apenas imaginária ou retórica, dos princípios da segurança jurídica, da liberdade e da igualdade de todos perante o direito.” (Novo código de processo civil comentado, São Paulo: RT, 2015, p. 962).
Por fim, os arts. 1.032 e 1.033 do NCPC trazem regramentos sem correspondência no CPC/73, visando ao combate de situações nas quais ocorre verdadeiro vácuo de competência. Assim, quando o relator do recurso extraordinário entender que há apenas inconstitucionalidade “reflexa”, pois a discussão está calcada na revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, deverá encaminhar o recurso ao STJ para que o aprecie como recurso especial. Desse modo, não poderá o Superior Tribunal de Justiça recusar o julgamento do referido recurso, pois as hipóteses de cabimento de sua competência derivam do próprio Texto Constitucional (art. 105, III), interpretado, em última análise, pelo Supremo Tribunal Federal.
Dentro de toda essa nova lógica exposta, e também de acordo com posicionamentos firmados pelo Fórum Permanente de Processualistas Civis, é possível dizer que estão superados os enunciados 115, 187 e 418 da Súmula do STJ, os enunciados 528, 634 e 635 da Súmula do STF e também a OJ nº 140 da SDI-I do TST.
Gostou do artigo? Então conheça o Curso de Atualização ao CPC/2015 e fique atualizado com todas as alterações advindas com a nova codificação.